"Não quero que isso aconteça com mais nenhuma mulher"
Esterilizada contra a vontade, Janaína ainda teve a filha recém-nascida arrancada dos braços; depois que seu caso foi parar em rede nacional, ela passou a sofrer também com o preconceito dos moradores da pequena Mococa, onde vive
Anna Beatriz Anjos, da Agência Pública
Era uma manhã fria e ensolarada de julho quando encontrei Janaina Aparecida Quirino sentada em frente a uma casa térrea com portões pintados de azul, em Mococa, no interior de São Paulo. No dia anterior ela havia completado 37 anos, mas seu semblante cansado indicava que não havia muitas razões para comemorar. Um mês antes do nosso encontro, a mulher de pele escura e cabelos presos num rabo de cavalo ficara conhecida em todo o país por um episódio que suscitou acaloradas discussões na imprensa e nas redes sociais: havia sido submetida a uma laqueadura involuntária por decisão do juiz Djalma Moreira Gomes Júnior, da 2ª Vara de Mococa. O procedimento, realizado em fevereiro deste ano, atendeu a uma ação civil pública proposta por Frederico Liserre Barrufini, promotor da Infância e da Juventude da cidade.
A história se tornou pública em 9 de junho, quando Oscar Vilhena Vieira, diretor da Faculdade de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV) de São Paulo, escreveu uma coluna no jornal Folha de S.Paulo sobre o caso, de acordo com ele, uma “aberração jurídica”, permeado por irregularidades e violações à lei (leia aqui a íntegra do processo).
Foi aí que a pequena Mococa, com cerca de 69 mil habitantes, chegou ao noticiário nacional. No fim de junho, o Fantástico, da TV Globo, exibiu reportagem com Janaina sobre o acontecido, o que tornou as coisas ainda mais difíceis para ela. “Achei que não deveria ter feito isso [conversado com a imprensa], porque hoje não posso sair na rua, erguer a cabeça. A cada lado que olho, um vem e me critica, um vem e me chama de vagabunda, de moradora de rua, coisa que eu nunca fui”, conta. Por isso, embora tivesse o que dizer – respondeu a todas as minhas perguntas sem hesitar –, ela relutou em permitir que publicasse sua entrevista. Pediu tempo para pensar melhor e autorizou apenas no dia seguinte, quando voltei a visitá-la e garanti que suas declarações não apareceriam na televisão.
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